Sexta-feira 13! Para toda uma geração (temo dizer, a minha) a expressão traz à mente um gigante de máscara de hóquei na cara e peixeira na mão, perseguindo adolescentes e com um faro especial para moças com implantes de silicone e moças e rapazes que acabam de perder a virgindade.
A série cinematográfica, iniciada em 1980, já rendeu 12 filmes, incluindo títulos como Sexta-Feira 13 – O Capítulo Final, seguida, é claro, por Sexta-Feira 13 – Um Novo Começo. Dois filmes mais tarde, em Sexta-Feira 13, Parte 6 – Jason Vive, o assassino em série Jason Vorhees é ressuscitado por um raio, depois de anos morto e enterrado. O que é bom para Frankenstein é bom para Jason! Este é um dos meus filmes favoritos da série, junto do absurdo Jason X, que se passa numa estação espacial (!!).
Sexta-Feira 13 é um dos exemplos mais bem-sucedidos e conhecidos (ao lado de Halloween e a Hora do Pesadelo) de franquia de slasher movies, filmes em que um assassino em série persegue e mata um grupo específico de vítimas, geralmente adolescentes, de forma gráfica e explícita. Esses filmes também são chamados de idiot plots, ou “enredos de idiota” – porque se as vítimas parassem de se comportar como idiotas por cinco minutos, o assassino, na maior parte das vezes, seria facilmente capturado.
Além dos filmes, a franquia Sexta-Feira 13 gerou ainda histórias em quadrinhos, livros, games e emprestou o título a uma série de TV que não tem nada a ver com o universo original dos filmes.
Mas, afinal, por que tanta celeuma em torno dessa data específica, a sexta-feira 13? Existe até uma palavra para isso: parascevedecatriafobia, embora não conste das edições que tenho à mão do Aurélio, do Houaiss e nem esteja registrada no Vocabulário Ortográfico ad Língua Portuguesa, é a palavra que descreve o medo irracional de sextas-feiras 13. Como sói acontecer no caso de palavras longas e enroladas, a culpa, se não é dos alemães, é dos gregos. O vocábulo vem de “parasceve” (sexta-feira, ou mais exatamente, “véspera do sábado”), “decatria” (treze) e “fobia” (medo).
Segundo o Dictionary of World Folklore de Alison Jones, as raízes da superstição em torno da data estão na narrativa da morte de Jesus de Nazaré: numa sexta-feira, após uma refeição, a Última Ceia, onde havia 13 pessoas à mesa, incluindo o traidor Judas Iscariotes.
Para quem acha essa explicação muito comezinha, há uma alternativa um pouco mais esotérica: foi na sexta-feira, 13 de outubro de 1307, que um grande contingente de Cavaleiros Templários (protagonistas ou coadjuvantes em nove de cada dez teorias da conspiração), incluindo o líder da ordem, Jacques de Molay (1244-1314), foi preso na França. O psicólogo Stuart Vyse, autor de livros e artigos sobre superstição, afirma que a versão envolvendo a Última Ceia é mais povavelmente a correta.
Câmara Cascudo, em Superstição no Brasil, anota que “o dia 13 é o dia do contra, o dia do tudo às avessas, o dia do pé esquerdo”, onde desaconselham-se “reuniões, jornadas, festa, casamento, noivado, batizado, compromissos”.
No clássico Os Sertões, Euclides da Cunha (1866-1909) registra que as forças que iam combater Antônio Conselheiro, na malfadada Primeira Expedição contra o Arraial de Canudos, partiram da cidade baiana de Juazeiro na noite de quinta-feira, 12 de novembro de 1896, “para não seguir a 13, dia ázigo. E iam combater o fanatismo...” Militares brasileiros já levavam superstição a sério, como se vê, muito antes da cloroquina.
A conjunção entre o sexto dia da semana e o décimo-terceiro do mês, além de tida como agourenta, é uma das mais comuns que existem: o livro Nonplussed!, do matemático Julian Havil, traz um capítulo inteiro dedicado a demonstrar como, no calendário gregoriano (o nosso), é mais provável que o dia 13 do mês caia numa sexta-feira do que em qualquer outro ponto da semana.
A prova completa é detalhada demais para caber neste espaço mas, feitas as contas, conclui-se que quase 15% de todos os dias 13 caem em sextas-feiras, contra uma média de 14% para os demais dias da semana. O segundo dia mais provável para receber o número 13 é a quarta-feira. O dia menos provável é o sábado.
Sabendo-se em que dia da semana cai o 1º de janeiro, é obviamente possível prever quantas sextas-feiras 13 um determinado ano terá, e em que meses. O mínimo é uma (sim, não existem anos sem sexta-feira 13!) e o máximo, três.
Embora as pessoas aqui no Brasil considerem a sexta-feira 13 de agosto especialmente sinistra, se o ano não for bissexto, ela é também a única. O que deve servir como fonte de alívio. Em anos bissextos, se houver uma sexta-feira 13 em agosto, ela será sempre prenunciada por outra, em fevereiro.
Superstições, é claro, são falsas, mas o fato de uma parcela significativa da população levá-las a sério tem o potencial de produzir efeitos reais. Há estudos, por exemplo, que detectam um impacto da sexta-feira 13 no mercado de ações. Especula-se muito sobre o efeito do medo de sextas-feiras 13 na economia, porque muitas pessoas evitariam fechar negócios, ou mesmo aparecer para trabalhar, nessa data. Embora alguns números meio assustadores apareçam na mídia (fala-se em perdas de US$ 800 mil a US$ 1 bilhão, só nos Estados Unidos), não encontrei referências sólidas a respeito.
E quanto aos gatos pretos? Há uma preocupação de que sextas-feiras 13 seriam dias perigosos para esses animais, por conta da superstição humana. Assim como ocorre na maioria das superstições, é difícil precisar a origem da associação entre gatos pretos, azar e datas supostamente “do mal”, como Halloween e Sexta-Feira 13.
Algumas fontes culpam a bula Vox in Rama, emitida pelo papa Gregório IX (1145-1241) em 1233, por ter iniciado uma onda de aversão a gatos pretos na Idade Média. A bula contém a descrição de um suposto “ritual satânico” em que uma estátua se transforma num gato preto, que é então idolatrado pelos satanistas. Mas a conexão é tênue: o texto papal pede ação contra os adoradores do diabo, não contra os gatos.
Carlos Orsi é jornalista, editor-chefe da Revista Questão de Ciência e coautor do livro "Ciência no Cotidiano" (Editora Contexto)