Este artigo é especial. Na verdade, é um pedido desesperado de ajuda. Para você que está sendo bombardeado por informações contraditórias o tempo todo. Você que está no fogo cruzado das fake news. Você, que como todo ser humano, quer voltar a trabalhar o mais rápido possível. Também queremos. Não aguentamos mais ficar presos dentro de casa. Tem muita gente em cima do muro, como bem descobrimos interagindo nos grupos virtuais de família. E ainda também tem algumas pessoas cogitando retornar às atividades normais.
Por alguns minutos, por favor, tente esquecer as questões ideológicas (eu sei que é difícil) concentre-se apenas na objetividade fria dos números. O Gráfico 1 ilustra a evolução dos casos confirmados de COVID-19 na China.
Parece complicado, mas não é. O eixo vertical mostra a quantidade de casos de COVID-19. O eixo horizontal indica o tempo (em dias). As bolinhas cinzas representam o número efetivamente observado de diagnósticos positivos. A curva preta ilustra o comportamento do que os estatísticos chamam, elegantemente, de distribuição exponencial. É aquilo que observamos na saída do estacionamento, depois de um Fla x Flu no Rio ou do confronto do Timão contra o Palmeiras: antes do apito final não tem ninguém, um instante depois não dá pra andar.
Todo trabalhador que depende de transporte público no Brasil também conhece o fenômeno. Uma coisa é chegar às 5:00 da manhã na parada de ônibus, outra é iniciar a viagem às 5:30, já que o cenário pode mudar radicalmente em poucos minutos.
Pronto: é isso o que acontece com o número de pessoas infectadas pelo novo vírus. De repente, há muito mais gente transmitindo a doença adiante. Como a população é finita, a curva exponencial não pode continuar crescendo para sempre. É aí que entra a curva vermelha em formato de S. A desaceleração do contágio ocorre a partir do momento em que a curva exponencial se transforma em uma curva logística. Foi o que o Ministro da Saúde chamou de platô. E como chegar aí?
Sem alternativa
O método mais seguro é o isolamento social. Tem outra forma? Não. E a questão econômica? O governo e a iniciativa privada devem trabalhar de forma coordenada, para minimizar os efeitos econômicos e sociais da paralisação.
Imagine que o seu objetivo é perder peso. Você pode investir em dietas alimentares e/ou exercícios físicos. Se adotar as duas abordagens, os resultados aparecem mais rapidamente. No caso da COVID-19, tentar frear a curva exponencial com medidas mitigatórias de isolamento vertical é a mesma coisa que tentar perder peso tomando cerveja, comendo feijoada e lanchando pudim de leite condensado. Você quer acreditar que vai dar certo, mas não dá. Ainda não está convencido? Veja o que aconteceu com a Itália (Gráfico 2).
A China demorou 24 dias entre o primeiro registro oficial de COVID-19 (31/12/2019) e o isolamento agressivo de Wuhan (ver linha vertical azul). Na Itália, o primeiro registro foi realizado em 31/01/2020 (um mês de diferença em relação à China). Todavia, medidas agressivas de isolamento apenas foram adotadas em 09/03/2020, ou seja, 39 dias depois (ver linha vertical verde). A diferença de duas semanas parece pequena. Mas, como estamos diante de um fenômeno exponencial, pequenos detalhes podem ter consequências catastróficas.
De acordo com nossas estimativas, a Itália deve ultrapassar a marca de 100 mil pessoas infectadas antes da China, mesmo tendo uma população que é apenas 5% da chinesa. Atualmente, a Itália contabiliza mais do dobro de mortes em relação à China. Perdemos 8.215 vidas italianas contra 3.292 óbitos chineses, o que dá cerca de 350 mortes evitáveis por dia, durante duas semanas. Esse é o preço que a população paga quando o governo hesita. Basta um único caso infectado para iniciar a distribuição exponencial. Para derrubá-la, a única saída técnica é o isolamento social. Tio, se você estiver lendo esta mensagem, por favor, não saia de casa.
Dalson Britto Figueiredo Filho é professor-assistente de Ciência Política na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Antônio Fernandes é mestrando em Ciência Política na Universidade Federal de Pernambuco
Lucas Silva é cientista político e estudante de Medicina na Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas