A verdade sobre a chegada do homem à Lua

Questão de Fato
12 jul 2019
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O módulo Águia retorna ao espaço, após a conclusão da primeira missão lunar
O módulo Águia volta ao espaço, com Armstrong e Aldrin a bordo, após a conclusão da missão lunar

Agora na segunda quinzena deste mês, comemoram-se os 50 anos do que foi “um pequeno passo pra um homem, mas um grande salto para a humanidade”. Neil Armstrong, famoso pela frase, foi o primeiro ser humano a pisar na superfície lunar, em 20 de julho de 1969. Seguem os dados importantes da missão para registro:

 

Missão: Apollo 11 / NASA

Data de lançamento: 16/07/1969 – 13:32h UTC (10h32 horário de Brasília)

Lançamento a partir do Centro Espacial John Kennedy – Cabo Canaveral, Flórida, EUA.

Data de pouso na Lua: 20/07/1969 – 20:17h UTC (17h17 horário de Brasília)

Data de pouso na Terra: 24/07/1969 – 16:50h UTC (13h50 horário de Brasília)

Chegada por amerrissagem no Oceano Pacífico

Tripulação: Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin ‘Buzz’ Aldrin

Neil Armstrong foi o primeiro ser humano a caminhar na Lua

Hoje, 50 anos depois, ainda há pessoas que afirmam (como aqui, por exemplo) que tudo isso não passou de uma farsa, mantida por uma grande teoria da conspiração sustentada pela NASA e pelo governo dos Estados Unidos. Porém, os argumentos que os conspiracionistas usam para “provar” que a viagem à Lua foi montada em um estúdio de Hollywood são facilmente desarmados à luz da ciência. Neste texto, vamos explorar alguns argumentos clássicos e mostrar como eles são insustentáveis.

Então... “O Homem não foi à Lua porque...”

“... foi apenas uma vez”

Esse é um mito muito comum sobre a ida à Lua. O evento mais conhecido, naturalmente, é a primeira chegada de uma tripulação humana ao nosso satélite natural, em julho de 1969. Porém, a partir daí até 1972 foram, no total, 6 missões tripuladas enviadas para a Lua: Apollo 11, 12, 14, 15, 16 e 17 – todas da NASA. Isso sem contar a missão Apollo 13, que também era tripulada enviada à Lua, mas que por um acidente não conseguiu pousar no satélite.

“... não havia tecnologia para isso”

É verdade que o ser humano sempre foi curioso sobre o céu. E mais que isso: estudos astronômicos remontam às civilizações antigas, pois a melhor compreensão do céu é essencial para entender as estações do ano e desenvolver meios de orientação. Tudo isso, necessário para a sobrevivência de uma civilização... No entanto, exploração espacial não se faz apenas por curiosidade e desejo. É necessário investimento de grandes somas, tanto em recursos humanos quanto em desenvolvimento científico e tecnológico. Esse investimento esteve associado, principalmente, a dois grandes marcos da história humana: a II Guerra Mundial e a Guerra Fria.

Durante a II Guerra ocorreu o primeiro ataque envolvendo míssil de longo alcance: em outras palavras, foguetes usados para ações militares. Isso fez com que as grandes nações percebessem que desenvolver tecnologias de foguetes era essencial para seu poderio bélico. Em seguida, no período da Guerra Fria, em meio à grande tensão geopolítica mundial, polarizada por Estados Unidos e União Soviética, houve a “corrida espacial”: afinal, quem chegaria primeiro ao nosso satélite natural? 

Veja que o pano de fundo dessa disputa não é a necessidade de saciar a curiosidade humana por si só, mas sim, de mostrar o domínio científico e tecnológico no desenvolvimento de foguetes. Quando uma das nações demonstrasse habilidade suficiente para desenvolver foguetes capazes de levar objetos e pessoas à Lua, então era necessário cuidado com ela, pois essa mesma tecnologia poderia conduzir facilmente um míssil para atacar a nação inimiga.

Isso mostra que a viagem à Lua não foi algo único, isolado, sem contexto e sem necessidade. Ocorreram vários avanços tecnológicos antes da chegada do ser humano à Lua, por exemplo:

 

Primeiro satélite lançado: Sputnik 1, pela União Soviética, em outubro de 1957. Ele reentrou na atmosfera terrestre em janeiro de 1958;

Primeiro ser vivo enviado ao espaço: cadela Laika, a bordo de um compartimento da Sputnik 2. Ela foi lançada em novembro de 1957 e reentrou na atmosfera em abril de 1958. Laika morreu horas após o lançamento;

Primeiro ser humano a orbitar o planeta Terra: Yuri Gagarin, um russo. Ele foi através da Missão Vostok 1, da União Soviética, lançada em abril de 1961. O seu voo orbitou o planeta uma vez e durou quase 2 horas, depois retornou ao solo;

Primeira mulher a orbitar o planeta Terra: Valentina Vladimirovna Tereshkova, russa. Ela foi na Missão Vostok 6, da União Soviética, lançada em junho de 1963. O seu voo orbitou o planeta 48 vezes e durou quase três dias;

Primeiro objeto de pouso suave na Lua: foi a espaçonave Luna 9, da União Soviética. Ela foi lançada em 31 de janeiro de 1966 e pousou na Lua suavemente em 03 de fevereiro.

 

Isso é apenas um conjunto de momentos históricos que mostram que a chegada da primeira tripulação humana à Lua não foi algo isolado. Várias conquistas importantes ocorreram antes. E, todas, advindas de grandes investimentos financeiros, estimulados pela pressão da Guerra Fria. Cada um desses marcos trouxe grandes contribuições para o melhor entendimento e desenvolvimento tecnológico para a sequência das missões.

Você pode ver aqui, por exemplo, uma linha do tempo com bastante informações sobre todas as missões enviadas com a finalidade de explorar a Lua.

“... nunca mais voltou lá, em tempos recentes”

 O primeiro motivo para nenhuma outra missão tripulada ter voltado à Lua após as missões Apollo é o óbvio: o fim da Guerra Fria e os cortes orçamentários. Os custos para enviar tripulações pra lá chegam facilmente a bilhões de dólares, isso sem contar os riscos à vida dos astronautas em missões desse tipo. Hoje em dia, com o grande desenvolvimento tecnológico de sondas e robôs não tripulados, essa é a opção mais viável para colher amostras lunares e também realizar estudos e medidas in situ. Além disso, atualmente os esforços não estão concentrados em fazer “vai e vem” na Lua... Agora o foco é Marte, o planeta vermelho.

“... as imagens das fotos e vídeos não poderiam ser feitas por causa da temperatura lunar”

A atmosfera desenvolve papel importante na regulação térmica. Como a Lua não tem uma, durante um “dia lunar”, próximo ao “meio-dia”, a temperatura pode atingir mais de 100o C, enquanto à “meia-noite” chega abaixo de –100o C. Como as fotos foram feitas e os próprios astronautas sobreviveram? O pouso na Lua ocorreu numa região adequada durante um período de “manhã lunar”, bem antes de a temperatura torna-se perigosa para a missão. Como a Lua leva cerca de 27 dias para fazer uma rotação em torno de si mesma, a “manhã lunar” dura vários dias, fazendo com que as temperaturas não fossem problema para fotos e filmagens.

“... as imagens tiradas mostram sombras com diferentes ângulos”

Nesse caso, o argumento centra no fato de que há apenas uma fonte de luz para as imagens: o Sol. Logo, todas as fotografias devem ter objetos que produzam sombras paralelas entre si. Eles alegam que as fotos tiradas não apresentam essa característica, ou seja, as sombras caem em diferentes direções. Como explicar isso? É simplesmente uma ilusão de óptica. Veja, por exemplo, a imagem abaixo, de Sean Kirby. Nela, o fotógrafo enquadra diferentes pedaços de madeira fincados no solo e iluminados por luz solar. A simples questão da perspectiva e da posição de onde a fotografia foi tirada faz parecer que as sombras têm orientações completamente diferentes umas das outras. Junte esse efeito às irregularidades do relevo lunar, e está explicada a “bagunça” de sombras que vemos nas imagens tiradas na Lua.

Estacas

Essa imagem, aliás, é usada como exemplo em vários outros artigos sobre o assunto, por exemplo, este aqui.

“... a fotografia com a pegada do astronauta na Lua é falsa”

O argumento diz que é necessário umidade no solo para haver a fixação da pegada, e, como não há umidade na Lua, não poderia haver a fixação clássica da pegada do astronauta. O que torna isso falso é que a fixação da pegada tem a ver com a composição do solo. O rególito (como é chamada a camada superficial do “solo” da Lua, que não é exatamente solo porque não contém material orgânico em quantidades significativas) lunar é semelhante ao pó do cimento e, da mesma forma que é possível fixar uma pegada clara no pó de cimento - quem duvida só precisa tentar -, também é possível fixar uma pegada na Lua.

Pegada na Lua

“... os cinturões de radiação da Terra impediriam a sobrevivência dos astronautas”

Existem regiões, no entorno do nosso planeta, que se encontram repletas de partículas carregadas:L são os chamados Cinturões de Van Allen. O argumento é que a dose de radiação recebida pelos astronautas, quando suas naves cruzam essa região, seria fatal. A falha no argumento é que essa radiação é feita de partículas carregadas e que podem ser barradas pela própria estrutura externa da nave. Além disso, a passagem do compartimento com os astronautas por essas regiões é rápida o suficiente para que eventuais doses de radiação recebidas sejam pequenas demais para representar perigo real.

“... as imagens tiradas na Lua não mostram estrelas no céu”

A tecnologia envolvida em câmeras fotográficas naquela época nem se compara com o que temos atualmente. Para fotografar estrelas, seria necessário fazer fotos com tempo de exposição longo, porque a luz do sol refletida na superfície clara da Lua, e nos trajes brancos dos astronautas, “ofusca” fontes mais distantes e menos luminosas, como as estrelas. Se as fotos tivessem exposição longa, a luminosidade dos demais objetos da superfície, mais brilhantes, saturaria as imagens. Logo, para tirar boas fotos da superfície e dos astronautas, não seria possível ver estrelas no céu. E, convenhamos, o foco da missão não era fazer fotografias das constelações no céu lunar...

“... a bandeira aparece tremulando em vídeos e fotos”

Esse argumento gira em torno do fato de que não há vento que deixe a bandeira esticada na horizontal, como costuma aparecer nas fotos. Além disso, as fotos também apresentam a bandeira com uma aparência “trêmula”, com a superfície irregular. Ora, se não há vento por lá, nada disso poderia acontecer. Esses dois pontos são relativamente fáceis de refutar: a bandeira está na horizontal porque é mantida assim por uma haste que segura a parte de cima do retângulo de pano. E a bandeira estava guardada em tubo pequeno, dentro do módulo lunar, onde todo espaço é disputado... A bandeira está, portanto, com o tecido amassado! É isso que faz a aparência irregular das fotos passarem a impressão de tremular ao vento.

Mas e quanto aos vídeos? Uma variante desse argumento costuma mostrar trechos gravados em vídeo em que a bandeira realmente está oscilando... Como explicar isso? A oscilação não ocorre pelo vento, mas sim por efeitos mecânicos do movimento que o próprio astronauta faz ao mexer no cabo da bandeira, e ao colocá-la no solo. É preciso lembrar que não há resistência do ar na Lua, pois não há atmosfera, e, assim, os efeitos de perda do movimento de oscilação demoram mais para parar o “vai e vem”, pois a dissipação ocorre apenas por atritos internos ao corpo da bandeira e da haste.

bandeira americana na Lua

            

Por fim, um golpe final à história conspiracionista é dado pelo que conta o astrônomo Ronaldo Mourão para a reportagem do portal G1, em ocasião do aniversário de 40 anos do pouso na Lua. Segundo ele, a principal evidência da veracidade do pouso na Lua é que os soviéticos nunca duvidaram disso. À época, a URSS tinha tecnologia avançada na corrida espacial, e poderia facilmente saber se os sinais da Apollo 11 estavam, realmente, vindo da Lua. 

Além disso, nos mesmos dias da missão Apollo 11, os russos enviaram a missão Luna 15, que acabou por colidir contra uma montanha lunar e se quebrar apenas um dia depois da chegada dos norte-americanos. Segundo Mourão, nesse período de sobreposição das missões, as agências russa e americana chegaram a trocar informações a respeito dos planos de voo de cada uma. Os russos tinham plenas condições de checar se o pouso na Lua foi ou não uma baita fake news...

 

Marcelo Girardi Schappo é doutor em Física e professor do Instituto Federal de Santa Catarina. Coordenador do projeto “Astro&Física” focado em divulgação científica de temas de astronomia e física moderna

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