Como funcionam as panelas de pressão?

Questionador questionado
27 abr 2023
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válvula

 

Recentemente, em Goiânia, repetiu-se uma cena preocupante: uma explosão de panela de pressão. Neste caso, por sorte, ninguém se feriu, mas a cozinha ficou seriamente danificada. Em casos anteriores, a situação já levou a desfechos fatais, como outro deste ano, em São Paulo, quando uma cozinheira foi atingida logo no seu primeiro dia de trabalho.

Eventos assim fazem com que muitas pessoas tenham um receio genuíno desse tipo de panela, e prefiram evitá-lo, mas também trazem à tona duas perguntas comuns: por que a panela de pressão cozinha os alimentos mais rapidamente? E como é possível operá-la de modo seguro?

 

Pressão e eficiência

As panelas de pressão surgiram no século 17, criadas pelo físico francês Denis Papin (1647-1713), tornando-se populares nos séculos seguintes graças ao fato de conseguirem cozinhar mais rapidamente alimentos que demoram muito para ficar prontos numa panela convencional. Exemplos clássicos são feijão, alguns cortes de carne e legumes, mas é possível encontrar receitas que incluem até macarrão e risoto.

O segredo da panela é o aprisionamento controlado do vapor de água, liberado durante o aquecimento e o cozimento dos alimentos. A borracha de vedação da tampa mantém o vapor contido na panela. Consequentemente, a pressão interna sobe até atingir um valor específico, previamente determinado, capaz de fazer a válvula (o “apito” no centro da tampa) se abrir e começar a liberar jatos de vapor.

O detalhe que pouca gente sabe é que a temperatura na qual a água ferve depende da pressão a que ela está submetida. Para a pressão ambiente “normal”, ao nível do mar, de 100 kPa (lê-se “quilopascal”), a fervura ocorre a 100º C. Numa panela em que o vapor aprisionado provoca uma pressão superior à do ambiente externo, a temperatura necessária para fazer a água ferver também se torna maior. A panela que tenho em mãos, no momento em que escrevo este artigo, mostra, no fundo, a gravação “80 kPa”. Isso significa que ela foi projetada para atingir uma pressão 80 kPa acima da externa. Portanto, se a usarmos ao nível do mar para cozinhar alguma coisa, sua pressão interna atingirá 180 kPa. Consultando um gráfico que mostra a relação da pressão com a temperatura de ebulição, vemos que a fervura da água lá dentro vai acontecer a uma temperatura próxima de 120º C. O alimento, exposto a uma temperatura tão elevada, fica pronto mais rápido.

Panelas de pressão explodem quando a pressão interna torna-se alta demais para o recipiente suportar. Uma das funções da válvula é exatamente impedir que isso aconteça, liberando o vapor em excesso e estabilizando a pressão interna.

 

Operação segura

O primeiro fator determinante para uma operação segura precisa ser observado já na hora da compra: verifique se a panela tem a certificação do INMETRO. É uma garantia de que o equipamento foi testado e aprovado sob condições específicas de qualidade e de segurança. Pelo mesmo motivo, procure por peças originais e por assistência técnica autorizada caso precise fazer um reparo nas válvulas ou na borracha de vedação. Outras orientações:

 

1. A panela precisa estar intacta, sem rachaduras, amassados e danos, pois isso pode ser indicativo de menor resistência mecânica e maior risco de uma falha catastrófica, levando a uma explosão;

2. É importante reduzir a intensidade da chama do fogão depois que ela atinge a pressão de trabalho (e o assovio ganha fôlego e regularidade), pois o excesso de energia recebido pela água, através da panela, pode acabar gerando uma quantidade de vapor maior do que a que ela é capaz de escoar pela válvula principal – o que é essencial pra manter a pressão interna em equilíbrio e dentro de um limite seguro;

3. É absolutamente necessário manter as aberturas internas das duas válvulas da panela sempre limpas e desobstruídas, além de verificar se estão em bom estado, livres de ferrugem, de amassados etc. A válvula principal (aquela do assovio) é responsável por liberar vapor em regime permanente, de modo a manter a pressão interna estável; além dela, existe pelo menos uma válvula auxiliar de segurança, que se rompe ou estoura de maneira controlada quando a pressão interna atinge um valor crítico. Obstruções causadas por alimentos ou sujeira são causas comuns de acidentes;

4. Sempre respeite o limite de capacidade interno, que vem marcado na panela e costuma corresponder a 2/3 do seu volume total. Isso vale para todo o conteúdo adicionado. Um erro comum é encher a panela de água até o nível da marcação para, depois, acrescentar os alimentos. Isso faz com que a capacidade máxima de segurança seja ultrapassada, aumentando as chances de algum pedacinho de comida acabar obstruindo a saída das válvulas;

5. Procure realizar a abertura correta da panela de pressão, o que envolve liberar o excesso de vapor gradativamente, pela válvula principal, enquanto a panela naturalmente vai esfriando, algo que pode levar 10 ou 15 minutos, aproximadamente. Quando for seguro fazer a abertura da panela, será possível perceber que, ao levantar manualmente a válvula principal, não haverá liberação de excesso de vapor, indicando equilíbrio da pressão interna com a externa. Deve-se evitar, portanto, a prática comum de se colocar a panela quente embaixo do fluxo de água fria da torneira para apressar o processo de resfriamento, pois o choque térmico pode levar, com o tempo, à diminuição da resistência e da vida útil do metal.

 

Sinais de alerta

Por fim, há, ainda, sinais de alerta que precisam ser observados. Um entupimento da válvula principal pode fazer com que o som do vapor saindo pela válvula se modifique, perdendo fôlego ou parando bruscamente. Nesse caso, desligue imediatamente o fogo e saia de perto. Espere a panela resfriar para abri-la e verificar o que aconteceu. O mesmo vale para o caso da válvula auxiliar de segurança se romper ou estourar, indicando um aumento preocupante da pressão interna. Caso não esteja próximo da panela quando esses eventos acontecerem, uma alternativa é desligar o suprimento de gás fora da cozinha, e somente se aproximar quando a panela já estiver a uma temperatura mais baixa.

Se, por um lado, dados dos Estados Unidos indicam que mais de mil mortes por ano estão relacionadas a acidentes com panelas de pressão, e um em cada três incêndios domésticos também estão relacionados ao uso indevido deste utensílio, por outro, a boa notícia é que a investigação das causas frequentes dessas ocorrências aponta que as dicas apresentadas neste artigo são suficientes para, se seguidas, manter você e sua cozinha em segurança.

 

Marcelo Girardi Schappo é físico, com doutorado na área pela Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente, é professor do Instituto Federal de Santa Catarina, participa de projeto de pesquisa envolvendo interação da radiação com a matéria e coordena projeto de extensão voltado à divulgação científica de temas de física moderna e astronomia. É autor de livros de física para o Ensino Superior e de divulgação científica, como o “Armadilhas Camufladas de Ciências: mitos e pseudociências em nossas vidas” (Ed. Autografia)

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