No dia 18 de outubro de 2024, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou a Resolução-RE nº 3915, na qual estabelece ações de fiscalização para os implantes hormonais manipulados, justificando a medida da seguinte forma: “Evidências fornecidas pela Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia apontam complicações relacionadas à segurança dos implantes hormonais manipulados, em desacordo com o item 2.3 do Anexo I - Boas Práticas de Manipulação em Farmácias da RDC 67 de 2007”.
Essa medida preventiva está fundamentada no art. 7º da Lei nº 6.360/1976. Para os que não estão familiarizados, o referido art. 7º determina que, como medida de segurança sanitária e em razão de motivos fundamentados pelo órgão competente, o Ministério da Saúde pode, a qualquer momento, suspender a fabricação e venda de qualquer produto regulamentado por essa Lei que, embora registrado, seja suspeito de ter efeitos nocivos à saúde humana.
Embora os implantes hormonais – também conhecidos como "chips da beleza" – tenham ganhado muita notoriedade recentemente, não são novidade. Na verdade, há publicações de mais de um ano que explicam os riscos associados.
Por exemplo, em dezembro de 2023 foi publicada uma carta conjunta de sete sociedades médicas, intitulada “Carta das Sociedades Médicas à Anvisa: Pedido público de providências quanto ao uso indiscriminado de implantes hormonais no Brasil”, na qual as entidades manifestam grande preocupação com a crescente exposição da população brasileira ao uso inadequado de implantes hormonais. Embora alguns implantes tenham usos legítimos (como contraceptivos de longa duração e na prevenção da endometriose, por exemplo), esses produtos são, na maioria das vezes, promovidos e prescritos com viés altamente comercial, sendo vendidos em consultórios médicos como “chip da beleza”, com promessas que incluem redução da gordura corporal, aumento da libido e da massa muscular.
Muitos implantes produzidos por manipulação contêm verdadeiros coquetéis de hormônios, com impacto incerto – e potencialmente perigoso – sobre a saúde humana.
Grupos que reúnem profissionais que defendem (e lucram) com a prática, como a Associação Brasileira de Hormonologia (ASBRAH), reagiram à decisão da Anvisa. Em abaixo-assinado, a ASBRAH argumenta que a decisão prejudica diretamente milhares de pacientes. Além disso, a organização afirma que os implantes têm segurança e eficácia comprovadas por artigos científicos – embora o material divulgado traga apenas referências incompletas.
A ASBRAH também considera inaceitável proibir os médicos de prescreverem implantes hormonais manipulados sem uma documentação científica adequada que comprove os efeitos adversos – substituindo o critério usual de se exigir prova de segurança para autorizar um procedimento por um de “prova de insegurança” para proibi-lo – e classifica a medida como retrocesso.
Vale esclarecer que os maiores problemas associados aos hormônios implantáveis estão na falta de evidências científicas tanto para as condições de saúde indicadas quanto para a via de administração utilizada; nos efeitos adversos; na possível falha no processo de manipulação, que pode resultar em um produto de menor qualidade e inseguro; e, por fim, na propaganda agressiva que promove o produto como panaceia.
O profeta do hormônio
Durante a pesquisa para este artigo, minhas buscas no Google e nas redes sociais revelaram inúmeros profissionais e empresas que, de forma velada, promoviam implantes hormonais para diversas condições de saúde. Por exemplo, em um story — que até considerei sóbrio — uma médica recomendou a reposição de testosterona, na forma de pellets ou gel, para mulheres com deficiência desse hormônio que apresentavam sinais de cansaço, fadiga, dificuldade em ganhar massa muscular e perda de peso.
Contudo, um nome em particular apareceu com maior frequência.
Trata-se de Gary Donovitz, obstetra e ginecologista, especialista em hormônios, autor dos livros “Age Healthier, Live Happier” e “Testosterone Matters... More! The Secret to Healthy Aging in Women”, além de fundador do Institute for Hormonal Balance (uma clínica que oferece práticas de reposição hormonal) e da BioTE Medical, um centro de treinamento em otimização hormonal e a maior fornecedora de terapia com pellets (implantes) hormonais nos Estados Unidos. Apesar de suas realizações, o que nos interessa — pelo menos agora — é uma pesquisa publicada por Donovitz em 2021, intitulada “Low Complication Rates of Testosterone and Estradiol Implants for Androgen Replacement Therapy in Over 1 Million Procedures”.
Nela, Donovitz e sua equipe avaliaram, de forma retrospectiva, as taxas de continuidade e os eventos adversos ocorridos durante a terapia com implantes subcutâneos de testosterona (T) e estrogênio (E), coletados ao longo de sete anos no BioTracker. Este é um registro em que os profissionais que implantavam pellets de hormônios forneciam dados sobre os possíveis efeitos adversos, além de informações sobre dosagem, local de fabricação dos pellets etc.
Pediu-se aos profissionais que realizaram o procedimento que reportassem as complicações, dados demográficos, dosagem, local de fabricação dos pellets e número de lote para a BioTE Medical, eletronicamente, usando o BioTracker, a cada duas semanas, durante o período do estudo.
Verificou-se que, durante os sete anos de coleta de dados (de 2012 a maio de 2019), 376.254 pacientes foram submetidos ao procedimento de implantes subcutâneos. Ao todo, foram realizados 1.204.012 procedimentos, dos quais 85% (1.018.516) em mulheres, cujas idades variavam de 25 a 92 anos, e 15% (185.496) em homens, com idades entre 35 e 85 anos.
Mais de 70% dos profissionais aderiram ao protocolo, abrangendo mais de 85% do total de procedimentos relatados durante o período. Dessa forma, foi possível calcular a taxa de continuidade no uso de pellets. Os dados demonstraram que 43% dos pacientes interromperam a terapia após a primeira inserção, embora não tenham sido registradas as razões específicas. A taxa de continuidade após duas inserções foi de 89,2% nos homens, 94,3% nas mulheres em pré-menopausa e 93,6% nas mulheres em pós-menopausa.
Além disso, entre os mais de 1,2 milhão de procedimentos realizados, somente 1% dos casos apresentaram efeitos adversos. Donovitz conclui, desses resultados, que a deficiência de testosterona e de estradiol pode ser tratada de forma segura com pellets de T e E. A elevada taxa de continuidade apoia a facilidade do procedimento, sua tolerabilidade e segurança. Ainda segundo ele, os resultados sugerem que, com treinamento e certificação avançados pela BioTE, profissionais experientes têm conseguido limitar eventos adversos e melhorar a aceitação da terapia de implante hormonal subcutâneo.
O estudo apresenta limitações que, em minha concepção, são importantes, mas menores, segundo o autor. Primeiro, a autoavaliação das complicações foi realizada pelos profissionais certificados e pelos próprios pacientes, o que pode introduzir o risco de viés de subnotificação e de seleção. Além disso, outras reações secundárias associadas ao uso de testosterona em mulheres, como crescimento de pelos corporais e faciais, acne e afinamento capilar, não foram analisadas.
Há ainda duas críticas extremamente pertinentes ao trabalho de Donovitz. A principal, nesse caso, é que ele apresenta um enorme conflito de interesse econômico, uma vez que é fundador e diretor médico da BioTE Medical. Isso explica a “propaganda” na conclusão, ao destacar que os profissionais treinados e certificados por sua empresa limitaram eventos adversos e melhoraram a aceitação — algo que não pode ser afirmado, já que em nenhum momento ele comparou a taxa de seus profissionais com aqueles que não possuem sua certificação.
A segunda crítica, que ele tentou mitigar ao afirmar que foram realizados mais de 1,2 milhão de procedimentos, refere-se ao grau de abandono do estudo, que foi de 43%, equivalente a 161.190 participantes que, por algum motivo, decidiram largar o tratamento, sem que uma explicação fosse registrada.
Em matéria publicada na Bloomberg Law em 2019, intitulada “Drug Marketer BioTE Didn’t Report 4,202 Adverse Events: FDA (1)”, a repórter Jacquie Lee expõe que a BioTE Medical recebeu uma notificação da FDA (agência americana que regula medicamentos e alimentos) devido a falhas no relato de mais de 4 mil eventos adversos relacionados aos seus medicamentos hormonais personalizados.
Segundo a investigação conduzida pela FDA em 2018, os medicamentos personalizados — também conhecidos como medicamentos manipulados — estiveram associados a: câncer endometrial, câncer de próstata, AVCs, infartos, trombose, extrusão e celulite.
Manipulação faz diferença?
Curiosamente, para nos aprofundarmos nesta seção, temos dois estudos que abordam esse tema, um de 2021 e outro de 2023.
Começando pelo mais recente, Kresch et al. publicaram na Sexual Medicine um artigo intitulado “Efficacy and safety outcomes of a compounded testosterone pellet versus a branded testosterone pellet in men with testosterone deficiency: a single-center, open-label, randomized trial.” Trata-se de um estudo prospectivo, randomizado e de não inferioridade (para determinar se um novo tratamento ou procedimento é menos eficaz que outro, já estabelecido). Compararam-se os perfis de segurança e eficácia de pellets manipulados pela Empower Pharmaceuticals (marca E100) e dos pellets de testosterona industrializados da marca Testopel.
Ao longo do acompanhamento dos voluntários, os níveis de testosterona nos grupos Testopel e E100 não apresentaram diferença estatisticamente significativa. A única diferença importante foi vista nos níveis medianos do hormônio estradiol, que, aos dois meses (1º acompanhamento), mais que dobraram no grupo recebendo E100, de forma inexplicável, mas sem causar efeitos colaterais.
Os autores afirmam que o estudo sugere que tanto os pellets de marca quanto os manipulados apresentam eficácia semelhante em elevar os níveis séricos de testosterona total para dentro dos limites de referência, sem diferença significativa no perfil de efeitos colaterais
Finalmente, concluem que, de acordo com os resultados deste estudo, não há inferioridade dos pellets manipulados E100 no tratamento do hipogonadismo masculino.
Como bem apontado por Kresch e colegas, o estudo não foi isento de limitações. Para começar há uma falta de validade externa (isto é, os resultados talvez não se apliquem à população em geral): a maioria dos voluntários era obesa, com idade na faixa dos 50 anos e de origem hispânica. Além disso, por tratar-se de um design de cegamento único, existe a possibilidade de que os resultados tenham sido enviesados: um dos coordenadores do estudo estava ciente do esquema de randomização. Cabe salientar ainda que, embora as doses sejam muito próximas, não foram iguais: enquanto o grupo Testopel recebeu 750 mg de testosterona, o grupo E100 recebeu 800 mg.
O ensaio foi financiado por meio de um “investigator-initiated grant” (um mecanismo de financiamento que apoia projetos específicos em áreas de interesse e competência tanto dos pesquisadores quanto de quem está financiando), fornecido pela Empower Pharmaceuticals, fabricante do E100.
Além disso, ao final da pesquisa, os autores declararam não ter conflitos de interesse, o que me pareceu contraditório, dado que só tomei conhecimento da existência deste trabalho por meio de uma publicação da ASBRAH, que agradecia o apoio de um dos autores, o urologista Ramasamy, R.
Em uma carta publicada, o Dr. Ramasamy aponta sua formação como urologista e especialista em reprodução, com foco em fertilidade masculina, disfunção sexual e terapias hormonais. Afirma ter mais de 500 artigos publicados. Dentre esses, destaca que conduziu um ensaio clínico randomizado (RCT) – o mesmo que acabamos de revisar – que demonstrou que os pellets de testosterona manipulados são uma alternativa segura, acessível, barata e eficaz.
Por fim, ele advoga, com base em seus achados e desfechos positivos, que os pacientes brasileiros devem ter acesso a essa opção terapêutica. Mas não menciona que o artigo do qual participou encontrou uma medição estatisticamente significativa para os níveis de estradiol no grupo que utilizou pellets manipulados. Existe a possibilidade de que isso tenha ocorrido devido a impurezas nos implantes, o que contradiz a afirmação de que eles são uma alternativa segura.
Essa questão se torna ainda mais clara ao analisarmos o estudo "Safety assessment of compounded non-FDA-approved hormonal therapy versus FDA-approved hormonal therapy in treating postmenopausal women", realizado em 2021. Neste estudo, Jiang, X. e colegas conduziram uma coorte retrospectiva com o objetivo de avaliar a segurança e as concentrações séricas de estradiol e testosterona livre em mulheres no período pós-menopausa tratadas com terapia hormonal, seja com pellets (PHT) ou com terapia hormonal aprovada pela FDA (FHT).
O estudo foi conduzido a partir do levantamento de dados de milhares de pacientes do Hospital Reading, no estado da Pensilvânia.
Os dados extraídos incluíram informações demográficas, sintomas iniciais da menopausa (como fogachos e diminuição da libido), efeitos colaterais (como alterações de humor, sensibilidade mamária, acne e ganho de peso), histologia endometrial (variações e características do tecido que reveste o interior do útero), níveis séricos de estradiol e testosterona, duração do tratamento e frequência de monitoramento laboratorial.
É importante ressaltar que, enquanto o FHT foi prescrito por todos os profissionais que ofereciam terapia hormonal para menopausa — num total de 24 marcas de produtos hormonais aprovados pela FDA —, os pellets hormonais foram prescritos apenas por duas clínicas privadas. Geralmente, esses pellets eram compostos de estradiol e testosterona ou eram da marca Sottopelle. A empresa promove os implantes para pacientes com Alzheimer, Parkinson e outras condições de saúde para as quais o produto não tem comprovação de eficácia. Além disso, é uma das patrocinadoras e expositoras do próximo congresso de hormonologia promovido pela ASBRAH.
A chance de eventos adversos foi aproximadamente 8,9 vezes maior no grupo PHT em comparação com o grupo FHT. Entre os sintomas mais relatados estavam ansiedade, sensibilidade mamária, alterações no padrão de pelos, acne e ganho de peso.
Conclui-se que, em comparação às mulheres em FHT, as mulheres do grupo PHT apresentaram uma incidência significativamente maior de efeitos colaterais, além de níveis máximos mais elevados de estradiol e testosterona durante o tratamento. Ademais, as principais sociedades médicas expressam preocupações em relação aos riscos associados ao uso de doses excessivas nos pellets compostos, bem como à falta de dados sobre segurança e eficácia e à ausência de bulas e alertas nas embalagens.
Dentre as limitações apresentadas, a principal diz respeito ao fato de que se trata de um estudo observacional e retrospectivo, que não utilizou amostragem aleatória para selecionar os participantes. Isso abre a possibilidade de erro de amostragem e viés de seleção, além de limitar a capacidade de inferir causalidade.
Além disso, houve diferenças significativas nas características da amostra entre os dois grupos, especialmente em relação à idade, o que pode ser interpretado como um fator de confusão. É importante destacar também que a maioria dos efeitos colaterais foi autorrelatada, o que, mais uma vez, não configura uma medição tão precisa.
Embora o trabalho apresente inúmeras limitações, que concordo, não confirmam um perigo intrínseco dos implantes hormonais, os autores fazem uma observação extremamente valiosa que explica, em parte, os potenciais problemas que os pellets podem ocasionar.
Com a associação descoberta entre reposição hormonal na menopausa e elevação do risco de certos tipos de câncer (uma situação em que fica a cargo do médico e da paciente sopesarem, caso a caso, os riscos e benefícios), muitas mulheres se mostraram apreensivas em relação à terapia convencional e passaram a buscar terapias alternativas. Surgiu aí a “terapia hormonal bioidêntica (cBHT)”, uma abordagem amplamente promovida por comerciais, programas de entrevistas e endossada por celebridades e livros de autoajuda.
Algumas pesquisas indicam que quase 50% das prescrições para terapia hormonal na menopausa, nos Estados Unidos, já são do tipo cBHT. Estima-se que ocorram entre 26 milhões e 33 milhões de vendas por ano, com receita superior a US$ 1 bilhão.
Apesar de muitos médicos discordarem da ideia de que a terapia hormonal convencional seja menos apropriada do que as preparações manipuladas, é importante ressaltar que a cBHT não inclui os avisos de segurança exigidos para produtos hormonais aprovados pela FDA. Além disso, devido à falta de evidências que sustentem sua segurança, é inadequado e antiético prescrever cBHT sem primeiro recomendar e incentivar as mulheres a tentarem produtos aprovados pela FDA.
Vale salientar que, embora o marketing dessas empresas abuse dos termos “bioidêntico” e “natural”, criando uma falsa dicotomia entre a segurança da terapia e a suposta insegurança dos produtos aprovados pela FDA, é papel dos profissionais de saúde esclarecer esses equívocos.
Com base no que revisamos até o momento, podemos afirmar que as empresas – e alguns profissionais – que promovem os pellets hormonais utilizam um marketing agressivo, pautado em um falso discurso de serem uma terapia mais segura do que a convencional. Muitas vezes, esses promoventes omitem os possíveis efeitos colaterais e os problemas de fabricação, como contaminações, que podem estar presentes nesses produtos.
Os fatos também refutam uma alegação falaciosa, amplamente compartilhada em redes sociais, que afirma que a Anvisa é um órgão atrasado que deveria adotar a mesma postura da FDA ao liberar e aprovar os implantes hormonais manipulados. Curiosamente, a posição da FDA é muito semelhante à da Anvisa, pois os pellets hormonais manipulados não são aprovados por nenhuma das agências.
Qual o consenso atual?
Há algumas diretrizes internacionais relativamente recentes, publicadas nos últimos três anos, que abordam a questão da “terapia hormonal bioidêntica” e da utilização de pellets hormonais.
A primeira, publicada em 2022, é intitulada “The 2022 Hormone Therapy Position Statement of Menopause Society”, na qual a Sociedade Americana de Menopausa convocou um painel consultivo composto por clínicos e especialistas na área da saúde da mulher e da menopausa.
No caso da “terapia com hormônios bioidênticos (cBHT)”, o grupo reconhece que existem duas variações. A primeira utiliza apenas hormônios bioidênticos aprovados pela FDA, como estradiol, estrona e progesterona micronizada, que são regulamentados e monitorados quanto à pureza e eficácia. Esses produtos são fornecidos com bulas e podem incluir advertências sobre eventos adversos.
Em contraste, há também a terapia com hormônios bioidênticos manipulados, que, diferentemente da anterior, são preparados em farmácias de manipulação. Essas terapias podem combinar múltiplos hormônios e utilizar formulações não testadas e não aprovadas. Além disso, podem ser administradas por vias não padronizadas ou não testadas, como implantes subcutâneos, pellets ou troches (um tipo de pastilha oral que se dissolve lentamente na boca).
Há uma escassez de dados de alta qualidade que forneçam evidências sobre a segurança e a eficácia da cBHT manipulada. As evidências disponíveis são insuficientes para apoiar o uso clínico da cBHT manipulada no tratamento dos sintomas da menopausa, e também apresentam preocupações de segurança.
O último consenso, possivelmente o mais abrangente até o momento, foi publicado em 2020 pelas National Academies of Sciences, Engineering, and Medicine dos Estados Unidos. O documento intitula-se “The Clinical Utility of Compounded Bioidentical Hormone Therapy: A Review of Safety, Effectiveness, and Use” e foi elaborado por um comitê designado para avaliar a utilidade clínica da Terapia de Reposição Hormonal Bioidêntica Manipulada (cBHT manipulada), a pedido da FDA.
O comitê das National Academies concluiu que não há dados suficientes para sustentar que as preparações de cBHT manipulada são tão seguras ou mais seguras do que as terapias hormonais aprovadas pela FDA, e que a supervisão inadequada e a falta de relatórios sobre eventos adversos representam uma preocupação para a saúde pública. A mesma ressalva pode ser aplicada à eficácia, visto que não há dados suficientes para apoiar que a cBHT seja tão ou mais eficaz que a terapia hormonal aprovada pela FDA. O uso atual reflete, em grande parte, a preferência de pacientes e prescritores por cBHT, potencialmente influenciados por campanhas de marketing e endosso de celebridades.
Mauro Proença é nutricionista
REFERÊNCIAS
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HALPEM, B. et al. Carta das Sociedades Médicas à Anvisa Pedido Público de Providências Quanto ao Uso Indiscriminado de Implantes Hormonais no Brasil. Disponível em: https://diabetes.org.br/wp-content/uploads/2023/12/Carta-das-Sociedades-Medicas-a-ANVISA.pdf.
ASBRAH. Em respeito aos pacientes, a autonomia do médico e contra o retrocesso. Disponível em: https://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR143764.
DONOVITZ, G. Low complication rates of testosterone and estradiol implants for androgen and estrogen replacement therapy in over 1 million procedures. Ther Adv Endocrinol Metab. 2021 May 27:12:20420188211015238. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34104398/.
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KRESCH, E. et al. Efficacy and safety outcomes of a compounded testosterone pellet versus a branded testosterone pellet in men with testosterone deficiency: a single-center, open-label, randomized trial. Sexual Medicine, Volume 11, Issue 2, April 2023. Disponível em: https://academic.oup.com/smoa/article/11/2/qfad007/7079741#google_vignette.
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THE NORTH AMERICAN MENOPAUSE SOCIETY (NAMS). The 2022 hormone therapy position statement of The North American Menopause Society. Menopause. 2022 Jul 1;29(7): 767 – 794. Disponível em: https://menopause.org/wp-content/uploads/professional/nams-2022-hormone-therapy-position-statement.pdf.
NATIONAL ACADEMIES of Sciences, Engineering, and Medicine. The Clinical Utility of Compounded Bioidentical Hormone Therapy: A Review of Safety, Effectiveness, and Use. 2020. Disponível em: https://nap.nationalacademies.org/catalog/25791/the-clinical-utility-of-compounded-bioidentical-hormone-therapy-a-review.