Tenho escrito com bastante frequência sobre a importância exagerada que se dá a rankings acadêmicos [1, 2, 3]. Podemos arriscar até uma conjectura: não importa qual o critério adotado pelo ranking, sua qualidade ou se esconde interesses comerciais, sempre haverá acadêmicos dispostos a fazer propaganda gratuita para a lista classificatória. (Deve haver algum estudo de psicologia que explique por que pessoas em geral têm fixação por listas de “melhores” e “piores” – incluindo algumas primordialmente subjetivas, como classificação de vinhos baseada no nariz e papilas gustativas de terceiros).
A revista Science publicou, em 27 de janeiro, editorial cujo título, em tradução livre, é “Revolta contra rankings acadêmicos”. O texto, redigido por H. Holden Thorp, editor-chefe da revista, apresenta uma crítica aos rankings, mencionando a relevante empresa de mídia U.S. News & World Report, pioneira na produção de classificações de universidades.
Em setembro de 2022, a Columbia University deixou de participar dos rankings de graduação da U.S. News, depois que um professor de matemática da instituição denunciou discrepâncias entre os números apresentados nos relatórios oficiais da instituição e os fornecidos para o ranking – com o segundo conjunto de dados pintando uma imagem irreal e mais positiva do que o primeiro. Com os números corrigidos, Columbia caiu de segundo lugar na lista para décimo oitavo.
Os cursos de Direito de Harvard e Yale também deixaram de participar dessa classificação. As universidades da Pensilvânia, Harvard, Stanford, Columbia e a Universidade de Washington St. Louis manifestaram-se contra os rankings de escolas de Medicina.
Nos últimos anos, listas que se propõem a criar escalas numéricas de qualidade acadêmica surgiram aos borbotões. Muitas não apresentam critérios detalhados do que está sendo levado em conta, e tantas outras cobram pelo acesso ao relatório completo ou, ainda, para corrigir alguma informação incorreta.
Uma fala atribuída a Charles Goodhart, economista, diz que “quando a métrica se torna uma meta, ela deixa de ser uma boa medida”. Quando universidades começam a criar políticas internas com vistas a melhorar os indicadores usados em rankings não porque os consideram bons marcadores daquilo que a universidade vê como sua missão, mas apenas porque são o que os rankings detectam e desejam, chega-se ao momento em que o rabo passa a balançar o cachorro.
Vários podem ser os motivos para uma universidade subir em um ranking. A instituição pode ter melhorado consideravelmente em diversos aspectos e superado as concorrentes – convenientemente, isso é o que as pessoas imediatamente assumem como primeira razão. Porém, modificações em posições na classificação geral, tanto para cima como para baixo, podem significar qualquer coisa.
É possível, por exemplo, ascender na classificação mantendo-se exatamente como está: é só as outras instituições piorarem. É possível também cair na lista com ações positivas: contratar formalmente pós-doutores que já se encontram atuando na instituição vai aumentar o número oficial de cientistas “da casa”, reduzindo a razão artigo/pesquisador, um indicador que muitas vezes entra na composição de rankings.
Situações hipotéticas, como as acima, mostram que o ranking per se não diz muita coisa. Por que, então, dar tanta importância para eles? Uma resposta imediata é que o sensacionalismo embutido em manchetes do tipo “Universidade/pesquisador A melhora em ranking B” gera engajamentos, cliques e congratulações, mesmo que não se saiba exatamente quais os critérios considerados ou os detalhes da avaliação.
Rankings externos, se tratados de forma crítica, com transparência e clareza quanto à composição, apuração e à lógica que guia a escolha dos critérios adotados, podem ajudar uma instituição de ensino superior a enxergar melhor como vem cumprindo sua missão – mas não devem ser confundidos com a missão em si, que pode variar de uma universidade para outra, e certamente varia, de acordo com a realidade em que cada uma está inserida, as necessidades da população a que atende e os interesses de estudantes e pesquisadores.
Marcelo Yamashita é professor do Instituto de Física Teórica (IFT) da Unesp e membro do Conselho Editorial da Revista Questão de Ciência