Em 2005, o jornalista americano Chris Mooney publicou seu livro The Republican War on Science, um compilado de evidências de que o então governo federal dos Estado Unidos – controlado, como agora, pelo Partido Republicano, de direita – vinha ignorando ou distorcendo fatos científicos importantes, em áreas tão diversas quanto aquecimento global, pesquisa com células-tronco e teoria da evolução.
Anos antes, em 2002, o psicólogo Steven Pinker havia publicado seu best-seller Tábula Rasa, em que argumenta contra a ideia, ainda hoje muito cara em círculos mais à esquerda, de que a natureza humana é infinitamente maleável, que educação, influência social e oportunidade podem transformar qualquer um em qualquer coisa.
Durante parte significativa do século passado, uma doutrina pseudocientífica – o lisenkoísmo, que negava a genética mendeliana e pregava a possibilidade de herança de características adquiridas durante a vida – dominou, por determinação governamental, a biologia na antiga União Soviética. No mesmo período, o ensino da teoria da evolução foi proibido, coibido, sabotado ou prejudicado em diversas áreas de domínio conservador nos Estados Unidos.
Quando o assunto é a supressão de verdades científicas inconvenientes – bem como a promoção de falsidades e distorções convenientes – não há cor, no espectro ideológico, que possa alegar inocência.
Toda ideologia pressupõe um diagnóstico sobre o que está errado no mundo, e uma receita para consertá-lo; se os fatos põem em dúvida a validade do diagnóstico, ou questionam a sabedoria da receita, é muito tentador ignorar tais fatos. Principalmente, quando o compromisso ideológico tem, como costuma ter, um forte componente afetivo e emocional.
Nos dias atuais, órgãos de imprensa mais identificados com a esquerda espalham temores exagerados – quando não injustificados – sobre transgênicos e agrotóxicos. Por sua vez, veículos de direita abrem espaço generoso para proponentes de teorias conspiratórias mirabolantes e infundadas, promotores do perigoso negacionismo do aquecimento global.
Já a trágica recusa à vacinação infantil encontra apoio tanto junto a setores da direita, que desconfiam das intenções dos agentes do Estado, quanto da esquerda, encantados com o suposto poder curativo da “natureza”.
A pseudociência, enfim, não tem partido específico: os partidos é que, muitas vezes, abraçam pseudociências específicas, cada um escolhendo os sabores mais adequados à sua visão de mundo.
Reconhecendo todos esses fatos, o Instituto Questão de Ciência nasce e se mantém apartidário, sem ideologia política. Que nossos simpatizantes, ou mesmo os membros individuais, tenham inclinações políticas próprias é tão humano quanto inevitável; mas a consideração primordial deste Instituto e desta revista será sempre o consenso da comunidade científica e a preponderância da evidência disponível.
Aos que militam na política, deixamos o apelo para que pautem suas ações no que realmente dizem as evidências, não no que gostariam que as evidências dissessem. Existe muito espaço para discordar sobre o que fazer com os fatos dados pela realidade; não é preciso, para além disso, negar realidades que estejam bem estabelecidas pela ciência.