COVID-19 faz explodir número de registros de síndrome respiratória

Questão de Fato
29 out 2020
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srag espirro

 

A epidemia de COVID-19 no Brasil ultrapassou em muito os números de casos de surtos de doenças respiratórias registrados em anos anteriores. Até o dia 3 de outubro foram registrados no país, neste ano, 333.255 casos de internação hospitalar por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) – que inclui parte dos casos de COVID-19 -, um aumento de 260% em relação aos 12 meses de 2009, o ano deste século com o maior número de ocorrências (90.465), neste caso por causa da epidemia de Influenza H1N1. Desse total, 259.042 eram de infectados pelo novo coronavírus – SARS-Cov-2 –, dos quais 84.353 morreram.

Os dados são de um estudo do Programa de Computação Científica da Fundação Oswaldo Cruz (Procc/Fiocruz), feitos a partir dos registros do Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe), do Ministério da Saúde. Pode parecer uma discrepância com os dados que vêm sendo divulgados pela Universidade Johns Hopkins, que monitora os casos de SARS-CoV-2 em todo o mundo, e pelo Consórcio de Imprensa, que reúne os dados de todos os estados do Brasil, segundo os quais o país já ultrapassou 5,3 milhões de casos só de COVID-19, com mais de 157 mil mortes.

O pesquisador Daniel Antunes Maciel Villela, coordenador do Procc/Fiocruz, responsável pelo estudo Níveis de Atividade e Incidência de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), explica que a diferença está relacionada à questão dos critérios de diagnóstico e notificação da SRAG. Nem todo caso de COVID-19 evolui para um quadro que preenche todos os requisitos para ser considerado um caso de SRAG. E estes primeiros dados constituem uma aproximação, pois ao considerar a oportunidade de digitação (tempo entre a data da notificação, a de preenchimento da ficha de notificação, e a de digitação, em que os dados entram no sistema), estima-se que já ocorreram 512.810 casos de SRAG, podendo variar entre 503.600 e 525.262 até o término da semana epidemiológica 40 (27 de setembro a 3 de outubro).

Os pesquisadores ressaltam, no estudo, que esses números consideram, dos casos reportados no SIVEP-gripe, aqueles em que constam alguns sintomas específicos da vigilância de SRAG, como dispneia ou saturação de oxigênio menor que 95% ou dificuldade respiratória. “Eles não levam em conta a existência ou não de febre como um dos sintomas, que é mais um dos determinados na definição internacional da síndrome”, explica Villela.

Esta exclusão se justifica porque para a epidemia de COVID-19, em que houve muitos casos em indivíduos de faixas etárias acima de 60 anos, por vezes a febre não foi um dos sintomas apresentados, mesmo em casos com hospitalização. Somados os casos com e sem febre, o número de internações por SRAG passa de 333.255 para 485.459.

Além disso, é preciso lembrar que este último número é apenas das internações hospitalares por SRAG, aí incluída a COVID-19. Os 5,3 milhões de casos de COVID-19 contemplam todos os notificados, com internação hospitalar ou não.

De acordo com Vilela, além dos números, o estudo mostra ainda que o padrão de espalhamento foi diferente pelo país. “Alguns estados na região Norte (Amazonas, Pará), na região Nordeste (Ceará) e Sudeste (Rio de Janeiro e São Paulo), em avaliações semanais, tiveram incidências muito altas desde a semana epidemiológica 11”, explica. “Outras unidades da Federação, principalmente nas regiões Sul e Centro-Oeste, tiveram aumento de incidência mais tardio, com a entrada da epidemia em fases”.

De forma geral, todos os estados foram acometidos pela epidemia. “De maneira mais crítica, todos, com exceção de Rondônia, Acre, Tocantins, Bahia e Espírito Santo, chegaram a exceder 10 casos de SRAG por 100 mil habitantes, sendo que houve semanas epidemiológicas em que Amazonas, Pará e Distrito Federal tiveram valores superiores a 20 por 100 mil habitantes”, conta Villela. “Então, uma conclusão é que houve uma entrada em fases e um processo de interiorização da pandemia”.

Segundo Villela, entre as causas do alto número de SRAG registrado este ano está o fato de o SARS-CoV-2 ser um vírus novo, ao qual a população ainda não havia sido exposta. “Por isso, o número de pessoas suscetíveis é muito grande”, explica. “É diferente de gripes com padrão sazonal, em que o vírus ‘reaparece’ com algumas possíveis mutações. Também há estudos que mostram alta taxa de contágio do vírus SARS-CoV-2, inclusive em outros países”.   

O pesquisador diz que seria possível que indivíduos possuíssem imunidade se já tivessem sido expostos à doença, ou com uma vacina. Mas, no início do ano, essas condições não estavam presentes. “Mesmo com ações de controle, como distanciamento, uso de proteção individual como máscaras e recomendações de higiene, não havia, em um primeiro momento, nem um tratamento específico nem uma vacina que poderia fornecer ação preventiva”, explica.

Para Villela, as ações de controle foram importantes para reduzir a intensidade da transmissão, isto é, se não fossem realizadas, o espalhamento seria mais rápido. “Portanto, o esperado era um efeito de reduzir o número de casos em um primeiro momento e distribuir ao longo do tempo a demanda no sistema de saúde, até que ele estivesse mais bem preparado”, diz. “Com o tempo, espera-se ainda que um número grande de pessoas desenvolva algum tipo de proteção e isto levaria a uma imunidade coletiva.  Este é mais um aspecto porque a vacina é importante”.

Evanildo da Silveira é jornalista

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