O que são os "alinhamentos planetários" de 2025

Artigo
20 jan 2025
ilustração do sistema solar

 

Desde o fim do ano passado, a mídia vem anunciando alinhamentos planetários raros para o início de 2025. No entanto, diferentes matérias apontam diferentes datas e diferentes conjuntos de planetas. Além disso, a divulgação faz parecer que “alinhamento” é algo raro quando, na verdade, raro mesmo é poder ver vários planetas na mesma noite e ao mesmo tempo. E, para completar, o tal “alinhamento” de visibilidade é apenas aparente, uma percepção nossa aqui da Terra, o que é diferente de um alinhamento verdadeiro no espaço, o que também vai acontecer em janeiro e em fevereiro, em alguns momentos.

 

Os planetas do Sistema Solar

Desde que Plutão deixou de ser considerado um planeta, em 2006, o Sistema Solar passou a ser composto por oito deles (Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano e Netuno), e todos fazem um movimento orbital (“revolução”) ao redor da única estrela do pedaço (o Sol). Mas cada planeta tem sua distância própria do Sol, o que faz com que cada órbita seja diferente das demais. O planeta mais próximo do Sol é Mercúrio; o mais distante, Netuno. A velocidade média do movimento orbital também é uma característica particular: quanto mais próximo do Sol, mais rapidamente o planeta viaja.

Outra característica interessante do Sistema Solar é que os movimentos orbitais compartilham, aproximadamente, o mesmo plano. Para entender o que isso significa, imagine que o Sol é uma bola de futebol no centro do campo, e os diferentes planetas são pequenas bolinhas de gude em movimento ao redor dele: os movimentos de revolução das bolinhas ocorre sobre o mesmo plano (a superfície do campo), sem que, ao longo do percurso, “voem” ou “afundem” de forma significativa. No Sistema Solar, os planos orbitais dois oito astros não são exatamente iguais, mas as diferenças são realmente pequenas.

E é exatamente isso que faz com que, sempre (vou repetir: sempre!) que se observar um planeta, aqui da Terra, ele estará em uma posição do céu que fica na vizinhança imediata de plano imaginário chamado “eclíptica”, que é justamente o plano descrito pelo movimento aparente do Sol, como visto aqui da Terra, ao longo do dia. Com isso, pode-se concluir facilmente que planetas “alinhados” sobre a eclíptica não é um evento raro. É um evento cotidiano e obrigatório.

Mas por que isso está chamando atenção agora? Porque o que não é frequente é que tenhamos a possibilidade de contemplar vários planetas ao mesmo tempo, na mesma noite, cada um em um local diferente do céu, para que possamos “ligar os pontos” entre eles e perceber que (como deve mesmo ser, sempre) eles estão “alinhados”.

 

O “Desfile Planetário”

Por conta do movimento de rotação terrestre (aquele que ela executa ao redor de seu próprio eixo), os astros parecem nascer a leste e se pôr a oeste. O Sol é o exemplo mais óbvio, mas, caso você nunca tenha reparado, isso também vale para a Lua, para os planetas e para as demais estrelas. Agora, como cada planeta tem uma órbita com um tamanho específico e uma velocidade média que lhe é particular, isso faz com que seja difícil calhar um dia (ou uma noite, no caso) em que, do ponto de vista de alguém na Terra, vários planetas estejam em regiões apropriadas das suas órbitas para que surja uma janela temporal de oportunidade para a observação simultânea de um conjunto deles.

Essa possibilidade de observação conjunta dos planetas não tem um nome específico na Astronomia, mas o termo “desfile planetário” (ou “planetary parade”, disseminado nas publicações em inglês) tem ganhado as manchetes. O motivo é que, enquanto os planetas estão visíveis no céu, todos eles estarão “em marcha” de leste a oeste – por conta da rotação da Terra – e, como discutimos, “perfilados” nos arredores da eclíptica.

Cabe ressaltar, ainda, que apenas cinco planetas do Sistema Solar são visíveis a olho nu: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. Portanto, quanto mais membros desse subgrupo estiverem no “desfile”, mais ímpeto costuma ter a divulgação do evento. Nas noites em que Urano e Netuno estão no céu, também é possível observá-los, mas somente com auxílio de telescópios.

 

Alinhamento aparente 

O alinhamento dos planetas nas cercanias da eclíptica durante os “desfiles” é apenas aparente, surgindo por conta de todos os planetas se moverem, como vimos, aproximadamente no mesmo plano no espaço. No entanto, existem momentos em que o alinhamento de astros de fato ocorre: como ensina a geometria escolar, dois pontos definem uma reta; assim, a Terra está sempre “alinhada” com qualquer um dos demais planetas, se considerarmos cada planeta um ponto no espaço. Quando as linhas imaginárias que ligam a Terra a dois ou mais planetas se aproximam,  o que vemos daqui é um “encontro” celeste (ou uma “conjunção”, tecnicamente falando): do nosso ponto de vista, os astros parecem chegar bem perto do outro, embora no espaço estejam bastante afastados.

Caso um dos astros passe efetivamente na frente do outro, podemos testemunhar os “trânsitos” ou as “ocultações” astronômicas: o primeiro termo se refere ao evento no qual o astro mais próximo da Terra tem um tamanho aparente menor que o mais distante, e, portanto, não o encobre totalmente; o segundo é o contrário, quando o astro à frente bloqueia completamente nossa visão do outro que ficou atrás.

Como as conjunções podem envolver diferentes astros – dois ou mais planetas, um planeta e a Lua, um planeta e uma estrela, a Lua e uma estrela etc. – acabam sendo eventos frequentes. Conjunções específicas, é claro, são mais raras. Em julho de 2021, por exemplo, entre os dias 10 e 13, tivemos um encontro triplo, no horizonte oeste, após o pôr do Sol: Marte e Vênus bem próximos um do outro, e ambos próximos à Lua; outra interessante aconteceu em dezembro de 2020, envolveu os dois maiores planetas do Sistema Solar (Júpiter e Saturno), algo que somente se repetirá em 2040.

 

Janeiro e de fevereiro

Agora que entendemos as conjunções (alinhamentos espaciais reais) e os alinhamentos aparentes dos planetas ao redor da eclíptica (que são mais evidentes quando há vários planetas no céu), estamos prontos para nos debruçarmos sobre o calendário dos eventos do início de 2025.

Ao longo de janeiro, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno estarão visíveis no céu. Urano e Netuno também marcam presença, mas não os veremos a olho nu. Considerando as horas do início da noite, Vênus e Saturno estarão próximos um do outro a oeste, formando uma conjunção entre os dias 17 e 19; Marte estará nascendo a leste com sua típica aparência avermelhada e Júpiter será o mais alto no céu (do conjunto dos visíveis).

Algumas matérias na mídia estão dando destaques para datas no final de janeiro, como 21 ou 26, mas não há nada absolutamente especial nelas. Esse destaque maior pode ser consequência do fato de que a última semana de janeiro é período de Lua nova, o que pode ajudar a perceber mais facilmente o brilho dos planetas.

Em fevereiro, logo no dia 1º, também no início da noite, a oeste, a Lua tem conjunção marcada Vênus. Urano (não visível a olho nu) e Saturno estarão ali pelos arredores, Júpiter seguirá sendo o mais alto do grupo dos visíveis e Marte estará mais a nordeste. Nas noites do dia 6 e do dia 9, a Lua faz conjunção, respectivamente, com Júpiter e com Marte.

Já nos últimos dias de fevereiro, Mercúrio pode se tornar visível logo após o pôr do Sol. Mas, agora, o cenário fica mais complicado, pois Mercúrio e Saturno estarão bem rentes ao horizonte oeste (com Vênus mais brilhante e mais para cima, também na mesma região do céu), e em um horário logo após o Sol se pôr. Portanto, pode ser que nem mesmo seja possível observar esses dois planetas a olho nu, seja por conta do crepúsculo ainda muito luminoso, ou seja por bloqueios causados por relevos do terreno, construções ou nebulosidade. De qualquer modo, tecnicamente falando, é fato que, nos últimos dias de fevereiro, após o pôr do Sol, os sete planetas do Sistema Solar estarão acima da linha do horizonte, e isso sim é algo mais raro.

 

Raro quanto?

Como os meses de janeiro e fevereiro deste ano abrigam noites com vários planetas visíveis e algumas conjunções, fica difícil determinar um prazo geral para quando tudo isso voltará a se repetir exatamente dessa forma. Mas é importante reforçar que a possibilidade de ver planetas no céu noturno é relativamente comum, e presenciar conjunções também não é difícil, já que várias ocorrem todos os anos.

Não consegui encontrar nenhuma tabela completa com as datas em que todos os sete planetas estarão novamente no céu ao mesmo tempo. Mas verifiquei que isso ocorrerá novamente (mas talvez não só) em maio de 2161, em novembro de 2176 e em maio de 2492. Reduzindo o número de planetas para a aparição conjunta, o evento fica mais frequente: em 2018 e em 2022, tivemos o pacote dos cinco; e, se considerarmos apenas quatro do grupo visível a olho nu, então, ainda este ano, poderemos presenciar Mercúrio, Vênus, Júpiter e Saturno, em agosto.

Agora, quando se trata de um alinhamento espacial verdadeiro de todos os planetas do Sistema Solar, aí sim é algo extremamente raro, estimado em uma vez a cada 13 trilhões de anos, aproximadamente. Mas o Sistema Solar tem cerca de 4 a 5 bilhões de anos de idade, e o Sol, futuramente, vai bagunçar um pouco as coisas quando eliminar Mercúrio e Vênus (e, quem sabe, a Terra) ao se tornar uma gigante vermelha daqui a mais ou menos 5 bilhões de anos. Em outras palavras, se arredondamos a existência do Sistema Solar como conhecemos para cerca de 10 bilhões de anos, então é bem provável que os oito planetas simplesmente nunca passem por um alinhamento espacial verdadeiro em conjunto.

Mesmo assim, acredito que vale a pena dedicar um tempo à noite, agora no início de 2025, para “caçar” planetas em uma busca atenta em meio ao céu estrelado. Fazer isso em conjunto com pessoas queridas pode ser ainda mais divertido. Uma dica interessante é que existem bons aplicativos que disponibilizam mapas virtuais do céu, onde se pode ajustar a data, o local e o horário da sua observação, que podem ajudar bastante na “busca planetária”. O Stellarium é um dos que eu mais gosto. Boas observações e muito céu limpo!

Marcelo Girardi Schappo é físico, com doutorado na área pela Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente, é professor do Instituto Federal de Santa Catarina, participa de projeto de pesquisa envolvendo interação da radiação com a matéria e coordena projeto de extensão voltado à divulgação científica de temas de física moderna e astronomia. É autor de livros de física para o Ensino Superior e de divulgação científica, como o “Armadilhas Camufladas de Ciências: mitos e pseudociências em nossas vidas” (Ed. Autografia)

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