Médicos na prevenção da violência armada

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20 fev 2024
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Em novembro de 2021, um adolescente com uma arma de fogo matou quatro alunos e feriu sete pessoas na Oxford High School, perto de Detroit. Foi o tiroteio escolar mais letal da história do estado de Michigan. Neste mês, em 6 de fevereiro, a mãe do atirador foi considerada culpada em quatro acusações de homicídio culposo. No julgamento, que analisou a segurança (ou insegurança) com que a arma era guardada, os promotores alegaram que ela havia sido incapaz de manter a arma em casa de forma segura, e ignorou sinais de alerta sobre a saúde mental do filho.

A violência com armas de fogo nos EUA é uma crise de saúde pública. De acordo com dados mais recentes dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças, 2021 foi o segundo ano consecutivo em que as armas de fogo foram a principal causa de morte de crianças e adolescentes americanos. Naquele ano, quase 49.000 pessoas morreram vítimas de tiros — equivalente a uma pessoa a cada 11 minutos.

Um relatório da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health mostrou que a posse de armas aumenta drasticamente o risco de morrer por homicídio ou suicídio. Durante uma crise de saúde pública, médicos têm papéis e responsabilidades importantes. A epidemia de mortes por armas de fogo dos EUA não é exceção. Muitas organizações profissionais de saúde, incluindo a Associação Médica Americana e o Colégio Americano de Médicos, recomendam que os prestadores de cuidados primários discutam a questão da segurança das armas de fogo com seus pacientes adultos.

À medida que as mortes por armas aumentam, é mais importante do que nunca que médicos priorizem conversas sobre segurança de armas com seus pacientes. Mas um estudo recente no Journal of General Internal Medicine mostrou que o nível de adoção dessa prática ainda parece muito baixo. Na época do tiroteio em Oxford, o principal autor do estudo, Joseph Ladines-Lim, era residente do segundo ano no programa combinado de medicina interna e pediatria da Universidade de Michigan, em Ann Arbor. No rescaldo da tragédia, Ladines-Lim e colegas lançaram um projeto de pesquisa examinando a prática da triagem de posse de armas de fogo em sua instituição.

“Será que pelo menos perguntamos às pessoas se elas têm armas ou não?”, Ladines-Lim disse. “E se estamos fazendo a triagem, como isso funciona em nossa instituição? E quando fazemos a triagem, com que frequência oferecemos aconselhamento adequado, em termos de como usar armas de fogo, ou guardá-las com segurança? E depois, estamos documentando isso?”

Os dados coletados sugerem que tanto os médicos quanto os pacientes tendem a evitar o assunto. Ladines-Lim e colegas sondaram 109 provedores de serviços de saúde a respeito da oferta de aconselhamento sobre segurança de armas de fogo durante consultas com novos pacientes. A pesquisa incluiu perguntas sobre treinamento prévio e se os provedores sabiam que o questionário pré-consulta dado ao paciente continha a pergunta de triagem: "Você tem uma arma em casa?"

Os pesquisadores descobriram que apenas 36% dos provedores se sentiam à vontade para falar sobre segurança de armas de fogo. Um fator que Ladines-Lim identifica é a relutância em comprometer a relação médico-paciente. “A questão das armas de fogo neste país é muito polarizadora. É altamente politizada”, disse Ladines-Lim. “E fica embaraçoso”.

A maioria (89%) não tinha treinamento sobre o assunto, e 32% desconheciam a questão da triagem pré-consulta. As opiniões estavam divididas sobre a importância de conversar sobre segurança de armas de fogo: 45% dos provedores concordaram que a triagem se enquadra em seu papel, e 33% discordaram. No entanto, os provedores mostraram-se mais propensos a abordar a posse de armas com pacientes com doença mental e transtorno por uso de drogas. Os provedores mencionaram a falta de treinamento e restrições de tempo como barreiras para abordar a segurança das armas de fogo com os pacientes.

O sistema de saúde está sobrecarregado, explicou Ladines-Lim, e nunca há tempo suficiente para abordar todas as preocupações de um paciente. Seria razoável, disse ele, que médicos se concentrassem em pacientes com fatores de alto risco, como depressão, em vez de fazer a triagem por atacado.

Ladines-Lim e colegas também revisaram 501 prontuários médicos de pacientes. Zero prontuários documentam aconselhamento sobre segurança de armas de fogo. Mais da metade dos novos pacientes pulou a pergunta sobre armas de fogo no questionário pré-consulta, mas preencheu o resto da pesquisa. Os autores concluíram que a decisão de não responder foi deliberada.

"Talvez eles achem que não é da nossa conta", disse Ladines-Lim.

Como o estudo pesquisou apenas um conjunto muito pequeno de clínicas, Ladines-Lim não sabe se os resultados têm validade mais geral. Ele e seus colegas creem que uma pesquisa mais ampla, abrangendo outros centros médicos e regiões geográficas, seria interessante.

A presença de armas de fogo em casa e a violência doméstica estão entrelaçadas. De acordo com a Everytown for Gun Safety, uma organização sem fins lucrativos de prevenção da violência armada, o acesso a uma arma de fogo aumenta em cinco vezes o risco de que uma mulher seja morta por um agressor doméstico.

Conversas sobre guarda segura são cruciais na consulta com pacientes vítimas de abuso, disse Jacquelyn Campbell, professora de enfermagem da Universidade Johns Hopkins e especialista em violência doméstica e íntima. “Como fazemos com que os profissionais de saúde ajudem as mulheres, particularmente — ou homens — que estão sendo abusadas por parceiros a denunciar, a obter ajuda cedo, antes que o pior aconteça?”

Primeiro, Campbell disse, não pegue o paciente de surpresa. Ela acredita que um breve preâmbulo — como: “A violência armada é a causa número um de morte de crianças, e eu sei que você tem filhos” — pode ajudar a legitimar a conversa. Como outra opção, um script curto pode ser programado no sistema de prontuário eletrônico, reduzindo as preocupações dos provedores com o tempo limitado.

Ladines-Lim concorda que, com a abordagem certa, os pacientes podem ser mais receptivos: “Qualquer coisa que pedirmos, em geral, pedimos porque estamos pensando no melhor para você”.

Alguns pacientes nunca vão querer falar sobre segurança de armas de fogo, “e temos de aceitar isso”, disse ele. Mas discussões abertas e informadas podem ajudar a evitar tragédias como o tiroteio em Oxford, e salvar vidas.

E isso não precisa ser politizado.

 

Jenna Jakubisin é editora e escritora de artigos sobre ciência baseada em Chicago. Ela está cursando um mestrado em Escrita Científica na Universidade Johns Hopkins. Artigo publicado originalmente em Undark.

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