Polarização sabota vacinação contra COVID-19 em partes dos EUA

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14 nov 2023
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Katherine Wells quer incentivar sua comunidade em Lubbock, Texas, a se vacinar contra a COVID-19. "Isso realmente poderia salvar as pessoas de doenças graves", disse Wells, diretora de Saúde Pública da cidade.

Mas ela não pode.

Uma regra adicionada ao orçamento do Texas, que entrou em vigor em 1º de setembro, proíbe departamentos de saúde e outras organizações financiadas pelo governo estadual de anunciar, recomendar ou mesmo listar vacinas contra a COVID-19 como uma opção particular. "As clínicas podem informar aos pacientes que as vacinas contra a COVID-19 estão disponíveis", permite a regra, "se não derem destaque a elas, em comparação a outras vacinas".

O Texas não é o único estado a restringir o diálogo com o público a respeito de vacinas contra a COVID-19. A página inicial do site do Departamento de Saúde do Tennessee, por exemplo, destaca a gripe, “vaping” e rastreamento de câncer, mas omite a COVID-19 e as vacinas contra a COVID-19. A Flórida é um caso extremo, em que o Departamento de Saúde emitiu orientações contra as vacinas contra a COVID-19 que contrariam estudos científicos e conselhos dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

A mudança nas informações sobre saúde acompanha a retórica, principalmente, de políticos do Partido Republicano que voltaram atrás em suas posições sobre as vacinas contra a COVID-19. A forte oposição a medidas como o uso de máscaras e o fechamento de empresas no início da pandemia alimentou a desconfiança em relação ao CDC e outras instituições científicas, e muitas vezes segue com as linhas partidárias: no mês passado, uma pesquisa da KFF descobriu que 84% dos democratas afirmaram ter confiança na segurança das vacinas contra a COVID-19, em comparação com 36% dos republicanos. É uma queda dramática em relação a 2021, quando dois terços dos republicanos foram vacinados.

À medida que novas vacinas são lançadas antes da onda de COVID-19 esperada para o inverno do Hemisfério Norte, alguns funcionários públicos do setor de saúde começam a agir com cautela para evitar reações negativas da população e dos legisladores. Até agora, a adesão às vacinas é baixa, com menos de 5% dos americanos tendo recebido a vacina atualizada, de acordo com o Departamento de Saúde e Serviços Humanos do governo federal. Wells teme que as consequências sejam graves: "Veremos uma grande disparidade nos desfechos de saúde, devido às mudanças na linguagem".

Um estudo publicado em julho determinou que republicanos e democratas em Ohio e na Flórida tiveram taxas semelhantes de mortalidade antes do surgimento das vacinas contra a COVID-19, mas a disparidade entre os partidos cresceu quando as primeiras vacinas já estavam amplamente disponíveis em 2021 e a aceitação divergiu. Até o fim daquele ano, os republicanos tinham uma taxa de excesso de mortalidade 43% maior do que os democratas.

Iniciativas de saúde pública sempre causaram polêmica nos Estados Unidos – fluoretação da água, redução de danos entre usuários de drogas e assistência médica universal, para citar algumas. Mas a pandemia aumentou o ruído a níveis dolorosos, dizem os funcionários de saúde pública. Mais de 500 foram levados a abandonar seus empregos em 2020 e 2021, e legisladores em pelo menos 26 estados aprovaram leis para impedir que autoridades públicas estabelecessem políticas de saúde. O senador estadual republicano do Arkansas Trent Garner disse à KFF Health News em 2021: "É hora de tirar o poder dos assim-chamados especialistas".

Inicialmente, os mandados de vacinação obrigatória foram polêmicos, mas as vacinas, em si, não eram. Scott Rivkees, ex-secretário de Saúde da Flórida, agora na Brown University, localiza a mudança nos meses após a eleição do presidente Joe Biden. Embora o governador da Flórida, Ron DeSantis, tenha inicialmente promovido a vacinação contra a COVID-19, sua posição mudou à medida que a resistência às medidas contra a deonça se tornou central para sua campanha presidencial. No final de 2021, ele nomeou Joseph Ladapo como secretário de Saúde. Naquela época, Ladapo já havia escrito artigos de opinião no Wall Street Journal contestando os conselhos médicos convencionais, como um que perguntava: "As vacinas contra a COVID-19 são mais arriscadas do que anunciado?"

À medida que os reforços das vacinas bivalentes iam sendo lançados no ano passado, a página inicial do Departamento de Saúde da Flórida removeu informações sobre as vacinas contra a COVID-19. Em seu lugar, havia regras contra vacinação obrigatória e detalhes sobre como obter isenções de vacinação. No início deste ano, o departamento desaconselhou a vacinação de crianças e adolescentes.

O aconselhamento dado pelo estado mudou novamente quando o CDC recomendou vacinas contra a COVID-19 atualizadas, em setembro. DeSantis afirmou incorretamente que as vacinas não haviam sido "comprovadas como seguras ou eficazes". E o Departamento de Saúde alterou suas orientações para dizer que homens com menos de 40 anos não deveriam ser vacinados porque o departamento havia conduzido pesquisas e considerado o risco de complicações cardíacas, como a miocardite, inaceitável. O anúncio faz referência a um documento curto e anônimo, postado online em vez de em uma revista científica, onde teria sido submetido a revisão pelos pares. O relatório usa uma metodologia não ortodoxa, e a maioria dos outros pesquisadores o considera uma peça de desinformação.

Estudos cientificamente revisados e a própria revisão do CDC contradizem a conclusão da Flórida contra a vacinação. Casos de miocardite após vacinas de mRNA ocorreram, mas são muito menos frequentes do que casos desencadeados pela COVID-19. O risco de o problema ser causado pela doença é sete vezes maior do que pelas vacinas de mRNA, de acordo com uma análise publicada em uma revista médica, com base em uma revisão de outros 22 estudos.

Desde que deixou o cargo, Rivkees ficou chocado ao ver o Departamento de Saúde do estado subjugado por interferências políticas.

Aproximadamente 28.700 crianças e adultos, desde o nascimento até os 39 anos, morreram de COVID-19 nos Estados Unidos. A mensagem antivacina da Flórida afeta pessoas de todas as idades, acrescentou Rivkees, não apenas os mais jovens.

Ele destaca que a Flórida se saiu bem em comparação com outros estados em 2020 e 2021, ocupando o 38º lugar em mortes por COVID-19 per capita, apesar de ter uma grande população de adultos mais velhos. Agora, ela tem a sexta maior taxa de mortes por COVID-19 no país.

“Não há dúvida de que o aumento da desinformação e a politização da resposta tiveram um impacto na saúde pública”, disse ele.

Assim como na Flórida, o Departamento de Saúde do Texas inicialmente promoveu as vacinas contra a COVID-19, alertando que os texanos não vacinados eram cerca de 20 vezes mais propensos a sofrer uma morte associada à COVID-19. Tais sentimentos desapareceram no ano passado, à medida que os líderes estaduais aprovavam políticas para bloquear mandados de vacinas e outras medidas de saúde pública. A mais recente é uma proibição ao uso de fundos governamentais para promover vacinas contra a COVID-19. A adesão no Texas já é baixa, com menos de 4% dos residentes recebendo o reforço bivalente lançado no ano passado.

No Departamento de Saúde de Lubbock, Wells conseguiu emitir um comunicado de imprensa dizendo que a cidade oferece vacinas contra a COVID-19, mas não as recomenda. "Não podemos fazer uma campanha tão intensa como outros estados", disse ela.

Alguns funcionários de saúde estão alterando suas recomendações, dadas as condições atuais. Janet Hamilton, diretora executiva do Conselho de Epidemiologistas Estaduais e Territoriais, disse que um conselho claro para se vacinar contra a COVID-19 funciona quando as pessoas confiam no meio científico, mas corre o risco de afastar outras pessoas de todas as vacinas. "É importante para a saúde pública ir ao encontro das pessoas", disse Hamilton.

O Departamento de Saúde do Missouri adotou essa abordagem no X, anteriormente conhecido como Twitter: "Vacinas contra a COVID-19 estarão disponíveis em breve em Missouri, se você estiver interessado. Se não, continue rolando!"

 

Artigo publicado originalmente em KFF Health News

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