COVID-19: Brasil tem seguido trajetória de EUA e Espanha

Artigo
3 abr 2020
Covid mapa

 

É uma questão de tempo e morte[i]A COVID-19 é a maior ameaça à saúde pública mundial desde a pandemia da gripe espanhola, provocada pelo vírus H1N1, em 1918 (FERGUNSON et al, 2020). De acordo com estimativas mais recentes do Center for Systems Science and Engineering (CSSE) da Universidade Johns Hopkins (EUA), existem mais de 1 milhão casos confirmados do novo coronavírus no mundo, totalizando mais de 50 mil mortes. O Gráfico 1 compara o Brasil com os quatro países que possuem o maior número absoluto de diagnósticos positivos (Estados Unidos, Itália, Espanha e Alemanha)[ii].

 

grafico 1 artigo grupo morte

Os Estados Unidos (265.506) têm mais que o dobro de casos confirmados da Itália (119.827). A Espanha também já ultrapassou a marca de 100 mil ocorrências. Por sua vez, a Alemanha ultrapassou a China (que está estagnada com pouco mais de 80 mil casos) e contabilizou quase 90 mil registros positivos para COVID-19. A curva do Brasil segue o mesmo caminho de crescimento observado nesses países, em fases iniciais de contágio. Tecnicamente, o grande desafio agora é reverter essa tendência e derrubar a curva, formando um “S”, tal qual fez a China.

O Gráfico 2 mostra a posição do Brasil em perspectiva comparada com os quatro países que exibem a maior quantidade absoluta de mortes (Itália, Espanha, Estados Unidos e França).

 

grupo morte gráfico 2

No total de óbitos, a Itália lidera (14.681), e a Espanha recentemente ultrapassou a marca de 10 mil mortes. Até agora, os Estados Unidos contabilizaram quase 7 mil velórios (1.049 só no dia 02/04). E a França, com 5.387 ocorrências fatais, ocupa a 4ª posição. O Brasil, representado pela linha vermelha, segue o mesmo caminho rumo a níveis mais elevados de mortalidade. O Gráfico 3 ilustra a relação entre o número total de casos e a quantidade de mortes por país.

 

grupo morte gráfico 3

Parece complicado, mas não é. O eixo horizontal representa o número total de casos confirmados até 03/04/2020. O eixo vertical indica a quantidade de mortes. As bolinhas pretas representam as observações, ou seja, o total de mortes por país. Já a linha azul indica o valor esperado de ocorrências fatais, dada a quantidade de diagnósticos positivos, o que os estatísticos chamam, elegantemente, de ajuste da reta de regressão. A camada cinzenta que envolve a linha indica o intervalo de confiança da estimativa, que aqui foi de 95%.

De acordo com nossas estimativas, cerca de 75% da variação no número de mortes pode ser explicada pelo número de pessoas infectadas. Calculamos também o impacto da quantidade de casos sobre o número de mortes. Anote aí: a cada 1% a mais de pessoas infectadas, devemos observar um incremento médio de 0,84% na quantidade de óbitos: é o que os economistas chamam de elasticidade. O Gráfico 4 reproduz a correlação entre número de casos e quantidade de mortes, agrupando os países por divisão[iii],  tal como um campeonato de futebol.

 

grupo morte gráfico 4

 

As bolinhas vermelhas representam os países que exibem, comparativamente, muitos casos confirmados e muitos óbitos. São eles: Estados Unidos, Itália, Espanha, China, Alemanha, França, Irã, Reino Unido, Bélgica, Suíça e Países Baixos. Por sua vez, o Brasil atualmente integra o grupo verde, ou seja, países que exibem níveis moderados de casos diagnosticados e de mortes confirmadas.

Mas o Brasil segue a mesma tendência de aumento, tanto no número de casos quanto na quantidade de mortes. E, dada a forte associação entre essas variáveis, é uma questão de tempo até o Brasil sair do grupo verde e entrar no grupo vermelho.

Como bem pontuou Nancy Messonier, diretora do Center for Disease Prevention and Control dos Estados Unidos, não é mais uma questão de  se vai ocorrer ou não, mas quando exatamente vai acontecer, e quantas vidas serão perdidas.

Assumindo que tudo mais permaneça constante, a situação do Brasil deve se agravar em pouco menos de duas semanas, e centenas de vidas serão diariamente perdidas para a COVID-19. Precisa desenhar? Sim, se o objetivo é deixar claro para representantes políticos, líderes comunitários e gestores governamentais que não estamos diante de uma “gripezinha”.

Dalson Britto Figueiredo Filho é professor-assistente de Ciência Política na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

Lucas Silva é cientista político e estudante de Medicina na Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas

 

NOTAS

[i] Inspirado no álbum “A Matter of Life and Death” do Iron Maiden, que serviu de trilha sonora durante parte da redação deste artigo.

[ii] Para os interessados em acompanhar a variação dos números em tempo real, sugerimos: <https://www.worldometers.info/coronavirus/>.

[iii] A classificação de cada país nas diferentes divisões foi realizada a partir de uma análise de cluster, técnica amplamente empregada na área de taxonomia. Em particular, utilizamos as duas variáveis de interesse (número de casos e quantidade de mortes) para agrupar os países em quatro grupos.

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